domingo, 26 de julho de 2009

Os gordos e os outros


Depois de uma hora passada desde a hora combinada, apaguei a televisão, onde a entrevista ao brilhante cientista Alexandre Quintanilha, assumidamente homosexual e professor catedrático, de espírito crítico e interessado nas diversas áreas do saber, desde o que é exacto ao que não o é. Este fez-me despertar uma luz, daquelas que não nos guiam nas noites escuras mas que antes nos abrem ou mostram caminhos antes precorridos, mas não caminhados com a convicção do pé firme.

Foi por volta do meio dia que saí de casa.

Não encontrei o carro que me deveria levar, num dia quente, mas não daqueles em que custa respirar, simplesmente agradável, mas não o suficiente para um dos meus "hiper". Lá vi o carro, lá entrei.

Chegado ao local, depois de uns esfregões, chego a uma casa, boa casa, no meio de um pinhal, com dois bons carros à entrada. A típica família de classe média. Não é com desdém que o digo mas, de facto, corresponde ao estereótipo que faço.

Ao sair do carro cumprimento com a minha mão meio comprida, muito fria, meio suada o "homem da casa", o "pai de família". É um homem alto, de grande barriga, de pernas finas, ou pelo menos não proporcionais, olhar trancado, cara rija, olhos não simétricos e de óculos. Com uma t-shirt branca, calções escuros e sapatos de vela castanhos. Tem um daqueles ares de homem forte, gordo na infância, meio bolachudo, de aspecto tosco. Javardola, bruto, bebedola, racista (ou etnicista?), homofóbico, jurista, praticante de tiro ao alvo e falando sobre o que sabe e o que não sabe.

Depois cumprimentei a mulher e os filhos, uma menina e um menino. A mulher, de cara bonita, corresponde a uma chouriça com o pneu característico daquela mulher de meia-idade, com o seu donut à cintura. De falar simpático, amável, prestável, gordita, baixa, de sapatos de vela castanhos e meio rotos na biqueira, de calções brancos e com uns bons, caros, óculos. A menina é em tudo parecida à mãe: gorda, baixa, risonha, de bonitos olhos e feições, simpática. O menino, inteligente, meio simpático meio arrogante é o mais magro. Aquele com sabores afinados e com subtis tiques efeminados.

Eu, pacato, assistia às diversas conversas que se iam desenrolando, sem que tivesse grandes razões para intervir. Falou-se de tudo um pouco, excepto de futebol, ainda que possa contar o nome de "Cristiano Ronaldo", entrentanto proferido pela mulher, esse fenómeno estupidificado, estupidificante, contagiante mas idiota.

Depois de ter tomado conhecimento de que o homem alto e forte, "pai de família", era jurista, antigo agente da Polícia Municipal, esperei alguma sensibilidade em determinados assuntos, contando eu que a formação superior valha de e para algo.

Não a encontrei, sobretudo numa das questões que agora vão estando na Agenda Política da Juventude Socialista, da Sociedade Civíl em geral. Aparentemente muito conhecedor de leis, muito pseudo-teorizador, defendeu a postura que eu adoptei outrora: a de que a defesa do casamento entre pessoas do mesmo sexo era errada - Diria: "... Porque hisotricamente falando, seguindo a lógica da Igreja, o casamento é só entre pessoas de sexo diferente e não entre pessoas do mesmo sexo"; "...Porque isso nem vai beneficiar sequer os casados, já que as contrapartidas fiscais dái resultantes não são as melhores"... - poderia continuar, poderia refutar agora, mas não quero. Quero somente que fique a imagem.

Se já na década de 50 do século XX um verdadeiro "King" chamado Martin Luther fez ouvir o seu sonho, e Harvey Milk também o seu, vinte anos mais tarde, pensei eu que chegados ao século XXI, encontrariamos, neste rectângulo à beira-mar plantado, aquilo que John Locke já vira na Flandres do século XVII.

Quero ressalvar, contudo, que tanto o machão, o bicha, como o heterosexual ou o homosexual, são, para mim, formas. Formas diferentes de encarar uma determinada realidade da mesma forma que o pintor pinta o que vê e não aquilo que o pintado vislumbrou. Porque importante é que cada um descubra a sua marca-cega, a sua forma de encarar a realidade, redescrevendo-a de acordo com o que pensa, pensando livre.

O que falta é ultrapassar, compreendendo, o preto, o cigano, o paneleiro, o pobre, o rico, o betinho, o thug lorde, o xunga, o neo-hippie, o surfista, o inteligente, o burro, o magro, o gordo, o eu e o outro. Parece que as palavras tolerância ou pluralismo andam longe, longe de serem (re)implementadas.

Falou-se de mais, falou-se, à boca cheia da saúde, da Gripe A, da redução do número de deputados na Assembleia da República... enfim, encontrei alguém que fala de tudo, mas que é frágil ao falar sobre um pouco de tudo.

Comi bem, fui bem tratado, bem aceite, pude discutir. Tomei banhos, fui à praia, jantei. Falei de armas, disparei uma pressão de ar com algum sucesso de principiante e voltei, cansado.

PS: Não revi o texto, quero ir dormir que estou com sono (1); desculpa, eu sei que te disse que ia dormir, mas comecei a escrever (2).

sexta-feira, 5 de junho de 2009

E depois?


Não era crente, mas voltei a ser.

Mas isso faz sentido? Não sei. Talvez importe explicar.

Até aos meus doze anos rezei antes de dormir. Um "Pai Nosso que estais no Céu" rezei eu durante sei lá quanto tempo e senti-me bem. Quis crer que, desse modo, qualquer asneira que dissesse, qualquer lesão que infringisse ao jogador da equipa contrária, qualquer pastilha que roubasse da mercearia seria perdoada, eu iria para um "Céu", teria, obviamente, um fantástico pós-vida, encontraria a "paz", não teria que estudar para passar de ano e não teria receio da morte porque estava certo do que estava do lado de lá. Não teria preocupações e não teria contas a prestar a ninguém, porque eu ia estar num sítio onde tudo me era permitido. Porque eu me tinha portado bem!

Ora, está claro que a ideia que eu tinha da religião seria um pouco como a ideia que qualquer criança tem do Natal e do homem da coca-cola. Se nos portarmos bem durante o ano e não chatearmos os nossos parentes, iríamos ter aquilo que desejávamos.

Mas fui, e sou, instrumento de uma dada ideologia de uma dada classe dominante (como diria o outro) e de um certo laicismo que me fez mudar de entendimento, da mesma forma que crescendo fui tão grande quanto o homem da coca-cola. Se me tornei num céptico em relação à religião também me tornei no meu próprio Pai Natal.

Agora a minha religião é outra. Agora não preciso de pensar no próximo mas preciso, sim, de fazer mais que o próximo, para meu próprio proveito. Não importa que não tenha em conta o próximo desde que eu esteja primeiro. Hoje sigo por uma via que vai de encontro ao que no homem é natural mesmo que tendamos a dizer que não. A natureza maléfica do génio humano não é ultrapassável por meios sermões e hoje, tal como ontem, é o indivíduo no centro de si próprio que interessa, porque o atomismo social não é fruto do acaso e a individualização mais não leva a que o homem seja fruto de uma guerra fria que o coloca em confronto com outros eus.

A minha fé é portanto o sistema capitalista. A minha crença é na moeda. Os meus valores, que são meio, chocam num agridoce que é o fim. Porque a justiça é meritocracia, não podendo ser igualdade.

Em que acreditar? Nos valores que são meio, ou num fim que é pano de fundo enublado?

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Nota:

Está criado.

É uma forma de escrever e não ser censurado. É uma forma de dar uso ao teclado e aos neurónios que por vezes me assaltam e que merecem mais espaço, mais concretização.

Não vou divulgar a minha identidade. Não é importante. Não vou divulgar o meu sexo/género ou a minha etnia, a minha idade ou a minha altura, a minha qualificação, a minha habilitação ou a falta dela. Escrevo procurando a marca cega que deve estar inscrita em mim, algures.

Sem mais assunto

Até ver.